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Notícia - Vencedor de prêmio aos 95, padre Daniel devolve poesia ao mundo

Ao telefone, da cama de um hospital recifense, Daniel Lima diz o que entende por poesia.

"É uma espécie de vômito da beleza. A gente tem necessidade de soltar a beleza que percebeu do universo. Temos o impulso irresistível de restituir a beleza vista por nós ao mundo a que ela pertence."

Aos 95 anos, Daniel Lima está lúcido e solar. Às vezes parece confuso.

Como quando foi informado pela reportagem, na última quinta-feira, que acabara de receber um prêmio da FBN (Fundação Biblioteca Nacional) pelo seu primeiro livro de poesia, "Poemas" (Cepe, R$ 45, 416 págs).

"Não é uma brincadeira não?", perguntou.

Não era uma brincadeira. Sequestrados por uma professora amiga entre as dezenas de inéditos que ele mantém guardado, os versos resultaram numa antologia de antemão não autorizada, mas depois assentida. Reunião de quatro livros, a obra foi inscrita pela "professora-ladra", Luzilá Gonçalves Ferreira ("roubei mesmo", diverte-se ela), no prêmio literário da FBN. Concorreu com outras 50 na categoria poesia.

Padre Daniel, como o autor é conhecido --há muito não exerce o sacerdócio, mas continua padre--, bateu nomes como Ferreira Gullar e Affonso Romano de Sant'Anna.

"É para acreditar mesmo, não é?" --ele continuava desconfiado da notícia.

"Você está falando de uma maneira convincente... Não me faça bancar o idiota, viu?"

Não. Daniel Lima não tem nada de idiota.

"Fico arrasado pela beleza que consegui apanhar na palavra que é tão pobre. O que escrevi me comove profundamente. O que eu escrevi passou de mim, transbordou-se do meu pensamento e da minha forma de configurar os objetos. Eu mesmo adoeço quando escrevo muita poesia."

E agora está no hospital porque adoeceu de quê?

"Adoeci de Daniel", responde rindo. "O mundo é muito importante, eu fico meio desorientado. Para me enquadrar nele eu tenho de sofrer, e adoeço."

(Amigos contam que Daniel está saudável apesar da idade. Foi parar no hospital porque não queria comer, ficou anêmico e desidratado. Já está melhor e deve ter alta nos próximos dias.)

Foi por temperamento, diz o poeta, que nunca quis ser publicado. "Fico meio encabulado de ser colocado em primeiro plano. A poesia para mim é um ato de intimidade e fico espantado quando vejo a repercussão, porque achava que era só eu quem via."

Num jorro, ele prossegue: "[A poesia] arranca de nós uma visão nova do mundo, como se fosse uma nova criação. O mundo me toca, a beleza acima do tempo e do espaço, me sinto fora de mim mesmo. Se não escrever qualquer coisa, me sinto mal. É como se Deus me desse um dom e eu não restituísse ao mundo".

"Depois que escrevo os poemas sinto que transcendi a mim mesmo, não fui eu, foi alguém que gostaria de ser eu. Aconteceu uma coisa esquisita. Eu sou meio besta, doido, acho que com o tempo ficarei ajuizado."


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